Palestras para SIPAT (I) - Uso Consciente do Crédito & Orçamento Familiar


Crédito: o tempero sedutor no universo do consumo 

Apresentação da Palestra

O Que é Crédito?
O Uso consciente do Crédito. Cuidado com as armadilhas do crédito!
Orçamento Familiar.
Não ter dívidas e viver feliz!
Poupar e ganhar é só começar!



Com Carlos André Santos

Antes disso, não se levava em conta que se poderia destinar um crédito ao consumidor.Também não se pensava que os consumidores valessem a pena a ponto de receberem um crédito. Quando os consumidores receberam um crédito, o receberam em dois sentidos. Por um lado, como indivíduos, tendo acesso a seus ganhos futuros. Por outro lado, como classe, ganhando um selo de aprovação pública por serem consumidores. Em 1927, aconteceu uma coisa muito engraçada quando o grande economista Edward Seligman saiu do asséptico mundo acadêmico para entrar no impuro mundo dos negócios. Ele era filho de banqueiros de Nova York. Seu pai, Joseph Seligman, era um concorrente de Pier Morgan. Mas Edward não se dedicou aos negócios da família. 

Ele estudou economia e era um acadêmico muito respeitado, quando foi convidado por Charles Kettering, responsável pelo sistema de crédito e financiamento da General Motors, a se juntar ao mundo dos negócios e pensar em uma estratégia para esta área. Seligman topou e se tornou responsável por essa nova linguagem, que hoje conhecemos, do crédito ao consumidor. Ele desfez a associação então existente entre consumo e doença. Na época, quando se dizia que alguém "estava consumido", esse alguém estava com tuberculose. Seligman fez com que o débito para o consumo de mercadoria parecesse algo natural, próprio, legítimo e vantajoso. Conseguiu elevar o nível da discussão pública sobre a venda de crédito, propondo uma nova nomenclatura, novos termos para descrever o crédito: crédito do produtor e crédito ao consumidor. Ele dizia que o homem não podia criar nada material, podia apenas dar movimento às partículas da matéria, arranjá-las em uma nova forma, de modo a gratificar algum desejo. E, por isso, acreditava que produção e consumo não poderiam ser distinguidos com precisão. 

E que o valor de um e de outro envolvia um cálculo da utilidade versus custo. Em sua linguagem, consumir um bem material não está relacionado à destruição física. Em psicanálise, a gente sempre trabalha com paradoxos. Aliás, vou fazer uma interpolação da minha fala, porque eu vivo quase exclusivamente da minha clínica psicanalítica. E vem ocorrendo uma transformação nas modalidades de sofrimento nos últimos 15 anos. As pessoas não sofrem mais como antes, ou não descrevem mais seus sintomas como antes. Esse fator tem muito a ver com essa figura do consumidor, com a lógica do mercado, de como a gente se define na modernidade. Em outros tempos, o que decidia o nosso lugar na sociedade era o sangue – se éramos nobres ou não. Nós, modernos, nos definimos por aquilo que consumimos. E acho que isso é uma coisa interessante. Não gostaria de voltar aos tempos antigos, com lugares determinados e prescritos por outra ordem. O quadro na próxima página é muito conhecido, é O Dia do Juízo Final, de Michelangelo, que está na Capela Sistina. 

Na época em que foi produzido, no Renascimento pós-Idade Média, havia outras regras, outras formas de subjetivação, outras maneiras de distinção. Hoje em dia, se fossemos pensar nesta cena retratada por Michelangelo, Deus estaria entregando um cartão de crédito para Adão e Eva. A imagem seguinte (na próxima página) é uma das minhas favoritas. É um anúncio na capa The Saturday Evening Post, de 1959, em que a gente vê um casal enamorado, à beira de um lago, ao luar. O musgo em torno da árvore lembra a serpente – é uma ilusão, uma blasfêmia materialista, evidentemente, mas é uma cena edênica. O casal está aí e o destino dele está escrito nas estrelas: casa, piscina, babá, cachorro, carro, a filha tocando piano. Se fosse uma pintura renascentista o céu estaria povoado de santos e divindades cristãs, mas no mundo moderno ele está cheio de objetos feitos, na sua maioria, por máquinas. Céu na terra, ou terra no céu? Quem sabe? Uma coisa, no entanto, é certa: o mapa astral dos amantes já estava ali delineado pelos objetos de consumo, financiados, evidentemente pelo sistema de crédito ao consumidor.

21 www.akatu.org.br As novas tecnologias implantadas nas fábricas e nas indústrias entre 1919 e 1929 causou uma enorme dispensa de mão-de-obra nos Estados Unidos. Dois milhões e meio de empregos desapareceram e a comunidade empresarial norte-americana tinha o desafio de transformar uma população de trabalhadores desempregados em consumidores. Para isso os meus colegas, os psicólogos do trabalho e os psicanalistas, entraram em ação para redirecionar a psicologia do trabalhador para psicologia do consumidor. Criou-se na época o chamado "evangelho do consumo". Um dos primeiros evangelistas do consumo foi Charles Kettering, da General Motors. Assim, o marketing passou a ter uma importância que nunca tivera até então no sistema de produção. Os anunciantes também redirecionaram os argumentos de seus anúncios. Os apelos de utilidade e de informação descritiva foram convertidos em apelos emocionais por posição e diferenciação social. A tese defendida pelos economistas dessa época era a de transformar o luxo dos prósperos em necessidade dos mais pobres. Eu transcrevi um documento da comissão da Presidência dos Estados Unidos, no governo de Herbert Hoover, que trabalhava com as mudanças econômicas. 

É um trecho muito interessante: "A pesquisa provou de forma conclusiva o que, logicamente, há muito se sabia ser verdadeiro: desejos são insaciáveis e um desejo satisfeito dá lugar a outro.A conclusão é que, economicamente, temos um campo sem fronteiras diante de nós, que existem novos desejos que abrirão caminhos intermináveis para novos desejos tão rapidamente quanto satisfeitos. Com a propaganda e outros dispositivos promocionais, criou-se um impulso mensurável na produção, demonstrando que podemos prosseguir com a atividade crescente. Nossa situação é favorável, nosso momento é extraordinário". Esta é uma lógica que podemos entender muito bem a partir de uma análise desta visão edênica, na imagem do jovem casal sonhando com a vida em família, com os objetos de consumo. Isso não muda hoje em dia, só muda o inventário. Na imagem seguinte, de uma propaganda recente da Amex, o Paraíso desceu do céu e veio para a Terra. O casal é conhecido nos Estados Unidos e tem uma incompatibilidade ideológica. Ela é uma representante dos democratas e ele dos republicanos. Eles são ghostwriters para alguns pronunciamentos de políticos norte-americanos. No anúncio, a idéia é de que o cartão de crédito resolve essas questões ideológicas. É tudo muito fácil de se resolver, desde que você tenha crédito. O crédito substitui, nesse caso, a conversa. A idéia do crédito em si não é maligna nem boa. Precisamos tomar muito cuidado com esse tema, porque ele desperta muitos preconceitos. Por um lado, estabelecemos no crédito uma relação com o tempo, de antecipação. Mas ele também parasita o futuro: eu como hoje do fruto de um tempo que ainda não alcancei. Eu não preciso poupar, nem trabalhar para fazer face aos custos que eu tenho hoje. 23 www.akatu.org.br E essa forma de colonizar o futuro, de parasitá-lo, é oposta à utilizada pelos índios, ou seja, eu faço uso da terra dos meus filhos ou dos meus netos. Essa também é uma forma de insustentabilidade, de antecipação. 

O critério que nos orienta hoje é diferente do passado, pois antigamente éramos regidos pela tradição. Na modernidade, no entanto, somos animados por um projeto interior, de um indivíduo com vontade de mudar a si próprio e o mundo. Porém, na alta modernidade, nesta era de capitalismo tardio, não somos definidos nem pela tradição, nem pela certeza de nossos projetos. O critério que nos orienta é a pergunta: "O que os outros pensam de nós?" Então, somos seres sociais como nunca, porque existimos a partir do olhar do outro. Ao mesmo tempo, somos solitários como nunca, pois, na hora de dialogar, é difícil encontrar sujeitos que estejam dispostos a oferecer algo a não ser os reflexos das identidades que a multidão reconhece e festeja. Nos Estados Unidos o sociólogo David Riesman previu que as eleições seriam decididas pelo marketing e não mais pelas idéias, porque está posta aí a idéia do olhar do outro. Para concluir, não poderia deixar de mencionar uma campanha que considero genial: a série "Não tem Preço", da Mastercard. É fantástico. 

Entrou na nossa língua, faz parte da nossa cultura. Quando queremos valorizar alguma coisa dizemos que ela "não tem preço". Na verdade, o que não tem preço é o reconhecimento.A gente sofre de necessidade do reconhecimento Esta é a origem de 99,99% dos casos de sofrimento que eu trato em meu consultório. As pessoas têm necessidade de ser reconhecidas ou amadas. E o que o crédito tem a ver com isso? As pessoas usam o crédito para hipotecar o próprio futuro, o do companheiro, o do filho. O pressuposto do crédito ao consumo é que você possa comprar com o que ainda não tem para consumir agora. Isso produz uma queima de recursos, pois o sujeito está consumindo além de sua riqueza. Mas esse é o segredo do desenvolvimento, isto é, que você tenha acesso a uma riqueza que ainda não tem hipotecando o futuro. Quando nos defrontamos com os efeitos da economia de mercado, como o esgotamento ambiental, o excesso de poluição, a desigualdade social, a frustração insuportável e contínua, é que pensamos na necessidade de inventar um novo consumidor. Como fazer para entregar às gerações futuras um planeta não esgotado, parasitado por regimes de arrogância, no qual os privilégios ficam com poucos e as restrições para a maioria? Precisamos agir de forma sustentável, tendo em mente a idéia de que as gerações futuras estão nos "hipotecando" confiança. 

Fátima Milnitsky Psicanalista 

Fonte:http://www.akatu.org.br/Content/Akatu/Arquivos/file/OConsumoConscienteDinheiroeCredito(1).pdf



Apresentação da Palestra

O Que é Crédito?
O Uso consciente do Crédito. Cuidado com as armadilhas do crédito!
Orçamento Familiar.
Não ter dívidas e viver feliz!
Poupar e ganhar é só começar!

Com Carlos André Santos





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